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Coruja nasceu em Porto Alegre,
em 31 de agosto de 1806 |
Coruja: pioneiro nas pesquisas da História do RS
Este blog homenageia essa figura ímpar da nossa história com o nome Antigualha, variação do seu famoso trabalho Antigualhas
Mais um dia de frio em Porto Alegre. Mais uma aula de latim do Padre Thomé. O
pequeno Antônio saiu de casa encolhido sob o novo casaco que ganhara para o seu
primeiro dia na classe. Quando o jovem entrou na sala, um colega não perdeu a
oportunidade de fazer chacota. “Parece uma coruja”, sentenciou, apontando para
Antônio que envergava seu novo agasalho num tom que ele mesmo descreve como de
burro quando foge. Daquele dia em diante, para os colegas, Antônio, passou a
ser o Coruja.
Esta é a história que da origem ao apelido do ilustre porto
alegrense Antônio Álvares Pereira.
Com o apelido agregado ao nome, Antônio inseriu-se na história da capital
gaúcha. Oficializou o Antônio Álvares Pereira Coruja, inclusive, tendo sido
adotado também pelo seu irmão.
E a alcunha não foi a única herança que levou da aula do Padre Thomé. Embora
estudasse para seguiu a carreira eclesiástica, como queria a família, Coruja
preferiu seguir os passos do mestre em outro ramo: o magistério. Foi lecionando
tanto no ensino público como privado, que conseguiu atingir grande prestígio na
cidade.
Aproveitando a boa reputação adquirida na sociedade porto alegrense,
candidatou-se a uma vaga na Assembleia Provincial, em 1835. Terminado o pleito
como suplente, logo foi alçado a uma cadeira no parlamento gaúcho.
O cenário político do Rio Grande estava agitado naqueles
dias em que Coruja começou a exercer o mandato como deputado. O grupo de
estancieiros liderado por Bento Gonçalves reclamava dos tributos cobrados pelo
Império na produção do charque e, em consequência dessa reivindicação, estourou
a Revolução Farroupilha. Coruja, por questão de justiça, posicionou-se ao lado
dos revoltosos, o que lhe custaria caro. Com a vitória imperial em Porto
Alegre, teve que deixar a cidade.
No Rio de Janeiro, Coruja voltou a fazer aquilo que melhor
sabia: ensinar. Fundou o Liceu Minerva, que lhe rendeu boa fortuna. Os bons
resultados do seu colégio o impulsionou a expandir seus negócios. A primeira
tentativa foi em 1960, quando tentou abrir uma companhia de seguros mal
sucedida. Em 1879, fundou a Caixa Depositária Sociedade Glória do Lavradio. Uma
confusão histórica fez com que, por muito tempo, se acreditasse que o gaúcho
fosse o fundador da Caixa Econômica Federal. Tal distorção já havia sido
esclarecida, mas recentemente um erro da própria Caixa levou o fato à mídia. Na
comemoração dos 150 anos do banco federal, divulgou-se não só que o Coruja
havia sido o fundador da instituição como mentiram quanto a origem do nome do
professor.
E a versão errônea a respeito do apelido Coruja é gerada justamente a partir da
falência da Caixa fundada pelo porto alegrense, que jamais teve qualquer
ligação com a sesquicentenária Caixa que conhecemos. Quando a sua instituição
financeira quebrou, Coruja sentiu tanta vergonha do fracasso a ponto de
considerar-se desonesto e não sair mais a rua durante o dia. Tentaram utilizar
esse fato como motivo para seu apelido, o que não é verdade, uma vez que o
próprio Coruja esclareceu a origem, ao relatar a história do casaco.
Morreu pobre, em 4 de agosto de 1889, tendo passado os últimos anos da sua vida
recebendo ajuda de estudantes gaúchos e morando num quarto emprestado. Mesmo
assim deixou herança valiosa. Claro que não foi em dinheiro. Tampouco para seu
único filho, conhecido por Comendador Coruja Filho, que faleceu antes do pai. O
grande legado de Coruja foram seus estudos da história do Rio Grande do Sul,
que serviu de impulso para todos os pesquisadores posteriores.
Desde que entrou no Instituto de História e Geografia do Brasil começou suas
investigações sobre a nossa história. Utilizou a revista do Instituto para
publicar muitos dos seus estudos sobre o tema como, por exemplo, Coleção de
vocábulos e frases usadas na província de São Pedro do Rio Grande do Sul e Anno
Histórico Sul-Rio-Grandense. Sua publicação mais importante, todavia, foi a
seção Antigualhas no antigo Jornal do Comércio, que mais tarde seria editada
como livro. As Antigualhas foram fruto da interminável pesquisa de Coruja e
resgatou grandes fatos e personagens do Rio Grande do Sul.
Dr. Sebastião Leão, ao escrever sobre Coruja no seu Datas Riograndenses,
destaca o pioneirismo do historiador e o homenageia, assinando a obra com o
pseudônimo Coruja Filho. “Coruja foi um investigador paciente, um simples
cronista apaixonado, e , como tal, deixou publicações esparsas, que serão
sempre manuseadas com proveito. Deixou-nos um belo exemplo de dedicação, sendo
o primeiro dos seus filhos que lembrou a urgência de ser escrita a história do
estado, partindo do princípio de que um povo sem história é uma nacionalidade
sem razão de ser na humanidade.