segunda-feira, 16 de maio de 2011

Aporelly

O humorista gaúcho que virou falso barão


Faculdade de Medicina de Porto Alegre – hoje abrangida pela Ufrgs. Exame oral da cadeira de anatomia. O professor Sarmento Leite, conhecendo o jeito do seu aluno, estendeu um fêmur e perguntou:
– Conhece?
– Ainda não. Muito prazer – respondeu prontamente Aparício Torelly, ao apertar a outra extremidade do osso.
Tiradas como essa se confirmaram como a marca registrada de Aparício, uma das mais irreverentes figuras de Porto Alegre.

Sua tendência para o humor começou cedo, ainda na escola. Interno do colégio dos padres jesuítas de São Leopoldo, o jovem – nascido em Rio Grande, em 1895 – criou o jornal humorístico Capim Seco, marcando também seu primeiro contato com o jornalismo.

Antes, porém, de colaborar ativamente com jornais de Porto Alegre, Aparício Torelly inclinou seu estudos para a área da saúde. E já nessa época não perdia a oportunidade de fazer uma boa piada. Aliás, é do tempo de estudante que se sabe de suas mais pitorescas histórias.

Uma delas aconteceu durante uma aula de Farmácia. Aparício complicou-se com as manipulações químicas propostas pelo professor Cristiano Fischer e desabafou:
– Mas logo o senhor, que tem uma farmácia, vem perguntar isso para mim?
Todavia, não eram todos os catedráticos que aceitavam com bom humor as brincadeiras. Certa vez um mestre se dirigiu a Aparício e perguntou:
– Quantos rins nós temos?
– Quatro – respondeu o aluno, sem vacilar.
– Quatro? – retrucou o professor já irritado por saber da fama de gozador de Aparício. Antes que o aluno pudesse se manifestar, chamou o bedel e disse:
– Traga um feixe de capim, pois temos um asno na sala!
– E para mim, um cafezinho – completou Aparício, não perdendo a oportunidade. O professor o expulsou da aula. Como se não bastasse, antes de sair explicou ao mestre:
– O senhor me perguntou quantos rins nós temos. Nós temos quatro, dois meus e dois teus. Tenha um bom apetite e delicie-se com o capim.

Não concluiu nem o curso de Farmácia, nem o de Medicina. Sua inclinação era mesmo para o jornalismo e humor. Publicou as primeiras colaborações na antiga revista Kodak, onde assinava como “Por Aporelly” ou “A por L”. E foi pelo pseudônimo que ficou conhecido, consolidando-o no seu livro Pontas de Cigarro.

Em Porto Alegre, também escreveu para a revista A Máscara e o jornal Maneca. Ainda fundou A Noite e a Reação, A Tradição e, enfim, o Chico, seu primeiro jornal de humor.

Aos 30 anos deixou Porto Alegre para morar no Rio. Quando chegou na Cidade Maravilhosa, procurou a redação d’O Globo. ¬Irineu Marinho (pai de Roberto Marinho) perguntou:
– O que o senhor veio fazer aqui?
– Tudo. De varrer a redação a dirigir o jornal. Creio que não ter haver muita diferença – respondeu Aporelly, que foi contratado na hora.

No Rio, ficou nacionalmente conhecido com o sucesso do jornal humorístico, que fundou, A Manha (e não A Manhã, para o qual escreveu anteriormente). Em 1931, auto intitulou-se Duque de Itararé, em homenagem à batalha que não aconteceu, na Revolução de 30. Como prova de modéstia, rebaixou seu falso título para Barão de Itararé, pseudônimo pelo qual ficou conhecido no país inteiro.

Morreu em 27 de novembro de 1971, aos 76 anos. Aporelly no Rio Grande, Barão de Itararé no Brasil. Este ano, se vão 40 anos sem Aparício Torelly, o humorista que aprendeu a fazer graça nas faculdades de Farmácia e Medicina de Porto Alegre e ganhou o Brasil com sua irreverência e bom humor.

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